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Horas Sem tempo- José Expedito Rêgo |
Horas sem tempo, livro de poesia de José Expedito Rego, é
uma obra interessante. O volume que li, uma fotocópia, é um presente que me foi
ofertado pelo oeirense Carlos Rubem Campos Reis, a quem muito agradeço.
Trata-se de um livro com alguns
poemas ambientados em Oeiras (terra natal do autor) como “Riacho da Mocha,
Malhadinha”, “Oeiras de minha infância”, “A lenda do Pé-de-Deus” e outros, mas
todos abordam questões que dizem respeito ao homem de qualquer lugar.
Nos vários poemas lírico-religiosos
do livro, é muito interessante observar como o autor faz um recorte e relaciona
trechos bíblicos com os dias de hoje, ora revestindo-os de humor, ora
enriquecendo-os com a tecnologia atual, ora ambientando-os em Oeiras. O
poeta diz, por exemplo, que os Três Reis Magos são pessoas da atualidade. Um
deles é motociclista; outro é um moreno à brasileira; outro, um negrinho
simpático. Esse trio se encontra na praça da Matriz e entra numa casa onde há
um presépio para lá aprontarem das suas e ainda contando com a simpatia do
Menino Jesus.
O episódio da Estrela de Belém, que
é reconfigurado com recursos da alta tecnologia de hoje, a vinda de Jesus ao
mundo, a traição de Judas, o Monte das Oliveiras... Tudo isso é revisto pelo
poeta com um sentido levemente humorístico e respeitoso.
O lirismo amoroso individual, centrado no eu que fala nos poemas, é colocado sem exageros sentimentais. Ou seja, é a emoção depurada pela contenção linguística, pelo trabalho com as palavras que o autor emprega em seus textos. Em alguns casos, como no poema “A caminho da fonte”, esse lirismo é totalmente centrado na figura humana retratada. Essa poesia, inclusive, tem influência camoniana, mas é bem original, bem nordestina. Faz gosto ler esse texto e admirar a simplicidade da garota descrita.
Como o autor era médico, a prática da medicina se efetiva em
alguns poemas como “Operação cesariana” e “Fórcipe na roça”. Mas, nessas
poesias, não é o ego do autor que se destaca. É a prática médica exercida com
humanismo e competência. No leitor, fica aquela sensação, aquela torcida para
que tudo saia bem. Além disso, esses poemas suscitam a impressão de que se está
diante de um médico humanista, aquele que vai atender a uma paciente muito
pobre que vive numa tapera. Num mundo em que a medicina é cada vez mais
elitizada, é confortador ver um médico fazer um parto complicadíssimo de alguém
que não tem a menor condição de lhe pagar. Isso nos leva a ter a certeza de que
ainda há esperança de uma vida melhor para todos. E na literatura, no cinema,
nas telenovelas, onde encontramos tanta violência, colocada com a desculpa
esfarrapada de que se está mostrando a realidade, é prazeroso encontrar um
médico humanista num poema.
Quanto à forma em “Horas sem
tempo”, encontramos poemas de forma fixa como o soneto e versos rimados e
metrificados, principalmente o decassílabo e a redondilha maior (verso de sete
sílabas poéticas). Mas encontramos também poemas de forma livre e o verso livre
modernista. Ou seja, é um livro onde o poeta trabalha com a tradição e a
modernidade ao mesmo tempo. É uma obra de boa poesia. Vale a pena ler. Precisa,
porém, de uma nova edição.
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