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Foto aquarela de Zuleica Tapety |
O Governador e Chefe das Armas, Major João José da Cunha Fidié, e sua tropa mais auspiciosa estavam ausentes de Oeiras — um erro crasso em um momento delicado, quando diversas partes do Brasil convulsionavam em levantes em prol do “Brado do Ipiranga”. A ausência do líder reforçava os ideais dos simpatizantes de rompimento com a Coroa Portuguesa.
Oeiras, então centro das decisões políticas, marcada pela animosidade partidária, se via dividida diante do debate sobre a independência do Brasil. De um lado, estavam aqueles que defendiam ferrenhamente a causa lusitana, como o Vigário da Matriz de Nossa Senhora da Vitória, Padre José Joaquim Monteiro de Carvalho Oliveira, que utilizava as celebrações litúrgicas para pregações acaloradas contra os "sediciosos". Do outro, os opositores que refutavam tal ideia e, de maneira ousada, liam escritos em locais públicos, alcançando uma população majoritariamente analfabeta. Essa ação inflamava os ânimos contra os portugueses.
A então capital do Piauí vivia mais um momento de tensão. Por trás das portas e janelas da casa de Manoel de Sousa Martins, desenhava-se o audacioso plano para a adesão do Piauí à independência do Brasil. O famigerado Brigadeiro contava com a notável intelectualidade do Padre Marcos de Araújo Costa e a lealdade indispensável de seus amigos e correligionários, como os coronéis Miranda Osório, Araújo Costa e Moraes Rêgo. Somado a tudo isso, havia a vaidade e as pretensões políticas, que afagavam os desejos de uma fidalguia cabocla do Brasil profundo.
Os dias passavam e, com eles, afiavam-se as espadas e os ânimos. A conjuração do Vale do Canindé já era uma realidade. O ideário ganhava força com missivas vindas da Bahia, que informavam que Dom Pedro I já havia sido aclamado Imperador do Brasil. Não havia mais tempo a perder: era hora de realizar o levante e formalizar o apoio ao novo monarca brasileiro.
Trocas de farpas, acusações, renúncias e reuniões conspiratórias movimentavam o meio político de Oeiras. Enquanto isso, as classes populares, alheias às disputas, pouco se beneficiariam do desfecho dessas querelas. Manoel de Sousa Martins, por sua vez, arregimentava as forças necessárias para confirmar seu prestígio e poder. Na noite de 23 de janeiro de 1823, os últimos detalhes para o levante de Oeiras foram formatados. Estratégias definidas, missões repassadas, jagunços e agregados a postos, aguardavam apenas o momento certo para tomar a cidade e seus espaços de poder.
Assim, na madrugada de 24 de janeiro de 1823, Oeiras aderiu ao "Grito do Ipiranga". Antes do amanhecer, entre duas e cinco horas, membros da antiga junta do governo fugiram, autoridades leais ao rei português foram presas, e os quartéis, a Casa da Pólvora e o Paço Municipal foram tomados. A cidade, que na noite anterior ainda vivia sob o auspício da Corte Portuguesa, despertou, aos primeiros raios de sol, livre! Ou, ao menos, sob o jugo das ordens de Dom Pedro I.
"Viva a Independência!" bradavam os fidalgos agropastoris e os agora homens de poder. No Largo da Matriz, reuniam-se em aclamações festivas ao jovem imperador: "Viva Dom Pedro!". As mulheres, como imaginou o historiador Solimar Oliveira, foram retiradas das salas e cozinhas pelos "vivas", unindo-se, ainda que brevemente, aos senhores da política. No entanto, sua participação ainda carece de protagonismo nos relatos históricos. Que novos estudos possam alterar essas verdades.
À medida que o sol esquentava, pouca coisa parecia mudar. O povo, em sua maioria, continuava em sua lida diária, e os negros escravizados permaneciam cativos. Já os senhores do poder seguiam para os espaços de decisão, prontos para tecer os destinos que os beneficiariam.
Se preferir, assista a esse vídeo que conta sobre a 👉 HISTÓRIA DO PIAUÍ e seus diversos acontecimentos.
Junior Vianna
Historiador e membro do Instituto Histórico de Oeiras